domingo, 22 de julho de 2007

Depois do Inverno

I

Tomando do ancinho e do enxadão
Cavei um canteiro no meu peito,
E lá semeei toda emoção
Junto com botões de amor-perfeito.

Desbastei com lágrimas ferventes
As minhas hortências belicosas,
E busquei em outros afluentes
Enxertos das mais bonitas rosas.

Com mãos calejadas pela dor,
Passei madrugadas acordado
Combatendo as pragas do Rancor
E as ervas plantadas pelo Enfado.

Por fim a camélia floresceu
Ao lado das meigas violetas,
E vendo florir o esforço meu,
Chamei ao jardim as borboletas!

II

Orquídeas, crisântemos e lírios
Refletiram nuvens de algodão;
E, vivendo fáusticos delírios,
Vi flores que os céus nunca verão.

Sequer percebi quando a Tristeza
Plantou pesadelos no meu sono,
E ao pisar a acácia indefesa,
Fez brotar o inverno de um outono.

Murcharam tulipas e gardênias,
Quedou-se ferido o meu jasmim;
Chorando e cantando tristes nênias,
Um cravo morreu perante mim.

Tomado por fúnebre agonia,
Borrifei nas pétalas meu sangue,
Contudo uma estranha leucemia
Fez do meu jardim horrível mangue!

III

Debaldadas foram as batalhas
Que travei em noite sepulcral
Para proteger com mil muralhas
Aquelas belezas sem igual.

Próximo do fim caí ao chão
Sentindo chegar a primavera
Para desfazer no coração
Aquele pavor que me lacera.

Sorrindo um sorriso de velório,
Vi que jardineiro também chora,
E restando um lótus merencório,
Implorei à Dor que fosse embora.

— Ó Senhor, venci essa medusa,
Porém os botões da flor que medra,
Longe dos cuidados de uma musa,
Em meu coração viraram pedra!

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